De volta ao Brasil, analista bancário lembra detalhes da rave onde Hamas deixou 260 mortos: ‘Espero que eu sobreviva’
10:35 08/11/2023
Um mês após escapar do ataque terrorista, Rafael Birman conta ao GLOBO sobre o terror vivido na festa, a qual quase desistiu de ir; hoje ele participa de evento no Memorial do Holocausto em São Paulo
09/11/2023 04h45 Atualizado há uma hora
De volta ao Brasil, o analista bancário Rafael Birman, sobrevivente do ataque terrorista do Hamas a uma rave em Israel em 7 de outubro, revelou ao GLOBO detalhes da tragédia que mudou sua vida. Em entrevista por telefone, o paulista de 30 anos disse que já estava apreensivo com o evento dias antes, sem motivo aparente, e por muito pouco não desistiu de ir ao dia que transformaria sua vida para sempre e, por pouco, não foi seu último. Ao chegar à festa, um detalhe — visto hoje com outros olhos — foi, para ele, um sinal de que o pior estava por vir.
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Nesta quinta-feira, Birman contará sua história no Memorial do Holocausto, em São Paulo, durante a cerimônia de 85 anos da “Noite dos Cristais”, como ficou conhecido o início da perseguição aos judeus na Alemanha e na Áustria, em 1938. Um período sombrio da História que, segundo ele, mostra como a violência contra o povo judeu “é algo que vem de muitos anos”.
Pressentimento ruim
Há cinco anos morando em Tel Aviv e acostumado com a agitada noite israelense, o brasileiro havia comprado com três meses de antecedência, por indicação da cunhada, o ingresso para a rave “Supernova Sukkot”, que receberia uma edição especial do festival brasileiro “Universo Parallelo” organizado pelo pai do Alok, o também DJ Juarez “Swarup” Petrillo. Mas ela mesma desistiu de ir e quase todos os seus amigos também. Até a data do evento, Birman ainda não tinha certeza se apareceria na festa — que só divulgou a localização exata, a menos de 20km da Faixa de Gaza, 1h antes.https://157a2e2e51aaeb4afe1f858651b125f3.safeframe.googlesyndication.com/safeframe/1-0-40/html/container.html
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— Eu estava com ansiedade sobre essa festa já alguns dias antes — afirma, dizendo que foi convencido a ir por seu amigo carioca Nathan Obadia. — A gente não sabia onde ia ser porque só divulgam o endereço uma hora antes do evento para evitar possíveis ataques terroristas. [Divulgar] a informação de um grupo aglomerado de judeus nunca é uma boa ideia.
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Birman chegou a brincar, em um áudio enviado a uma amiga, quando descobriu que o evento seria perto do enclave palestino: “Espero que eu sobreviva”, disse. Ao chegar ao evento no deserto de Negev, por volta das 2h da manhã, Birman ficou intrigado com o comportamento de um funcionário da festa.
— Sou uma pessoa muito comunicativa, então sempre dou ‘oi’, pergunto para as pessoas se está tudo bem. Falei com o menino que auxiliava no estacionamento e vi na cara dele que ele estava muito nervoso — afirma, explicando que o trabalhador, assim como a maior parte dos profissionais da organização, era de origem árabe. — Acredito que eles já tinham informações do que iria acontecer.https://157a2e2e51aaeb4afe1f858651b125f3.safeframe.googlesyndication.com/safeframe/1-0-40/html/container.html
Às 6h, o barulho de foguetes e tiros começou, e a música parou. O paulista estava na mesma barraca que outros brasileiros — como Ranani Glazer e Bruna Valeanu, que morreram na festa — e Rafael Zimerman, que conseguiu escapar. Dos 1,4 mil mortos no dia do ataque, 260 estavam na festa.
— A primeira coisa que me veio à cabeça é que eu iria morrer, então eu mandei um áudio para a minha mãe falando que estava no meio de um tiroteio e que, se alguma coisa acontecesse, eu a amava.
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Segundo ele, os seguranças do evento recomendaram às pessoas no local que aguardassem o fim dos disparos de foguetes, que costumam ser interceptados pelos sistemas de defesa israelenses, mas o brasileiro, por “instinto de sobrevivência”, correu com os amigos.
— As pessoas que esperaram ali 10 minutos a mais ou tentaram guardar a barraca acabaram sendo mortas pelo Hamas. Fui um dos primeiros a sair, não esperei aquele congestionamento do estacionamento, entrei com o carro no gramado e saí do caminho convencional — relembra. — Na estrada, me deparei com o carro de uma menina que tinha sido atacada, totalmente ensanguentada, gritando ‘terroristas!’
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Birman mudou a rota e seguiu rumo ao sul, mas foi encurralado por terroristas do Hamas, que começaram a atirar no veículo. “Por um milagre”, cinco soldados das Forças Armadas de Israel chegaram e revidaram os ataques. Nenhum dos passageiros do carro foi atingido, mas um dos militares ficou ferido e teve a perna amputada.https://157a2e2e51aaeb4afe1f858651b125f3.safeframe.googlesyndication.com/safeframe/1-0-40/html/container.html
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O dia seguinte
O paulista e seus amigos pegaram carona com os militares até uma cidade vizinha no sul do país, onde foram abrigados por um morador, e só então foram descobrindo a proporção da tragédia. Dois dias após o ataque, a mãe e a irmã do jovem, também brasileiras, decidiram retornar ao Brasil, embarcando no segundo voo de repatriação da Força Aérea Brasileira (FAB). Birman, no entanto, relutou à ideia de início.
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— Elas foram embora e eu fiquei sozinho em casa, mas estava com muita ansiedade. Saía na rua para comprar uma coisa básica no supermercado e ficava muito nervoso, com medo de eles [os combatentes do Hamas] invadirem por terra — conta. — Depois de sofrer tanta ansiedade, decidi que era melhor sair um pouco de Israel. Avisei no trabalho que ia tirar um tempo e fui para Lisboa, em Portugal. Comecei a passar um tempo sozinho, apreciar as pequenas coisas que às vezes a gente não aprecia. Estava feliz só por estar respirando.
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Depois de viajar um tempo pela Europa, o paulista chegou em 1º de novembro a São Paulo a pedidos da família e amigos. Ele conta que já fazia acompanhamento psicológico antes da tragédia e continua, como uma forma de lidar com o trauma. No Brasil por tempo indeterminado, Birman afirma que quer voltar para Israel quando a situação estiver mais estável:
— Eu construí uma vida lá.
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